2010-02-21

O que faz falta

Gostei muito da crónica de Miguel Sousa Tavares no Jornal Expresso de 2010-02-20 e em especial deste excerto sintético:



2010-02-19

Dama de Elche

No outro dia, ao passar no Paseo del Prado ao pé da Caixa Forum em Madrid, vi esta escultura





cuja tabuleta informava ter sido feita por Manolo Valdez em 2004, chamando-se “La dama”.

Trata-se de uma referência à Dama de Elche, uma escultura do século V AC, encontrada em 1897 em Elche, povoação a uns 30 km de Alicante.

Reconheci-a porque era um dos cromos da minha colecção de “Maravilhas do Mundo” que mostro aqui ao lado.

A estátua teve uma vida animada depois de descoberta, foi comprada por um francês e esteve exposta no Louvre vários anos até ser devolvida à Espanha, através de troca por outras obras de arte, onde ficou no museu do Prado até passar para o museu arqueológico de Madrid onde se encontra actualmente.

Numa próxima oportunidade irei vê-la (ou revê-la) pois já não me recordo de a ter visto. Às vezes acho que esse é um dos problemas das fotografias, uma pessoa pensa lembrar-se do que viu mas na verdade do que se lembra é das fotografias que tirou.

A seguir apresento duas imagens que estão na Wikipédia e outra de um blogue de teorias conspirativas que não me merecem crédito. Incluo a imagem deste último porque com uma mulher real se fica com uma ideia muito melhor do exotismo do adorno. Já nessa altura havia adornos femininos muito pouco práticos. Mas como estamos longe das mulheres de cara tapada...












Para finalizar, aqui sugerem que foi a Dama de Elche que inspirou o George Lucas, na caracterização da princesa Leia:

2010-02-15

Laranja iluminada

Tenho a sorte (e o engenho) de viver num prédio dos Olivais em Lisboa, desenhado por um arquitecto competente, que não desdenhou do saber antigo de usar janelas recuadas, seguidas de uma pequena varanda, cujas dimensões exíguas nos pouparam da tentação de as estragar com marquises. Durante o Verão o sol vai alto a não entra na casa, mantendo-a fresca, durante o Inverno o sol (quando descoberto) vai baixo e entra a jorros, reduzindo as necessidades de aquecimento pagante.

Foi o que aconteceu ontem, em que não resisti a fotografar uma meia laranja translúcida iluminada pelo sol. O prato está sobre uma mesa de vidro, o que pode tornar a cena um pouco confusa para quem não sabe.



Este post não contém nenhuma metáfora ao momento político actual, gostei apenas de ver e fotografar esta meia-laranja iluminada no meu pequeno-almoço.

2010-02-14

Portugal visto por El Corte Inglés – 2

Na sequência do post anterior mostro agora uma outra imagem, que me foi também enviada pelo El Corte Inglés, mas que ainda não tive a oportunidade de ver noutro suporte.



A imagem é muito apelativa mas com alguns problemas de detalhe.

Na versão completa que me foi enviada o “tecido de azulejo” prolonga-se para baixo formando uma espécie de cauda. No entanto, a mulher fica ali a vogar no ar, de uma forma algo artificial. Ao fazer o enquadramento do detalhe mostrado na imagem acima, optei por a cortar de forma tangente aos pés do modelo, que assim se “apoia” no limite inferior da imagem. Parece-me que além do “morphing” do azulejo sobre a pele do modelo, as zonas brancas do azulejo foram especificadas como transparentes, deixando entrever a pele do modelo. Mas num certo sentido o modelo parece sair da parede de azulejo, o que me deixa um certo desconforto.

O estilo surrealista parece-me particularmente delicado: por um lado aprecio muitas obras surrealistas pela forma como nos fazem ver coisas e relações que doutra forma nos passariam despercebidas mas, por outro lado, aparecem algumas de mau gosto. Não é o caso desta, que acaba por ser uma imagem globalmente muito bela, mas que desaponta um pouco na integração do belíssimo modelo no resto da composição.

2010-02-13

Portugal visto por El Corte Inglés

Há uns tempos, quando cheguei ao aeroporto de Lisboa, passei por este anúncio do El Corte Inglés que me chamou a atenção.

Depois de alguma manipulação da foto, acabei por obter a imagem que apresento em baixo, que me parece belíssima e onde uma pessoa “sente” que foram captados elementos muito típicos de Portugal.

Tenho um certo receio em me alongar muito neste texto, dizem que uma imagem vale mil palavras, mas ainda me surpreendo com o reconhecimento dos padrões arquitectónicos portugueses em terras distantes.

A esquadria colorida das janelas sobre uma parede branca é um desses padrões característicos, assim como os azulejos antigos sublinhando as janelas, neste caso amarelos e azuis, a combinação que nos é cara do “ouro sobre azul”.



Acho muito bem sucedida a ideia de transformar um elemento arquitectónico comum, o azulejo azul e branco, em dois tecidos, um como um vestido de cerimónia de longa cauda e outro esvoaçando ao vento tão constante na nossa costa, outro elemento característico de Portugal. A mulher também me parece portuguesa, no penteado e na posição corporal mas aí sinto-me em terreno mais delicado, na volta é uma estrangeira fotografada num fundo preto e colocada posteriormente na imagem.

Suspeito que a transformação do azulejo em tecido resulte de uma operação de “morphing” , de qualquer forma bem executada, incluindo sombras sobre a parede quer do vestido quer do tecido esvoaçante.

Acho que a imagem consegue um ambiente onírico, característico da publicidade de grande qualidade.

Como a foto foi tirada com o meu telemóvel e a sua qualidade deixava bastante a desejar, enviei um e-mail para o El Corte Inglés que simpaticamente disponibilizou outras versões, com muito melhor definição, desta mesma imagem, que passo a mostrar num detalhe:



Ou aqui numa das suas versões completas:


2010-02-10

Sino Tailandês

Os leitores mais assíduos talvez achem excessivo o meu interesse por sinos. Na altura em que fotografei este, em Julho de 1990 no Grande Palácio de Bangkok, ainda não teria lido o Amin Maalouf, mas serve-me agora como mais uma prova que os sinos não são essencialmente cristãos.

A imagem ficou sem contexto e já não me lembro da escala da construção, inclino-me para que o sino tivesse um pouco menos de um metro de altura.

Acho a torre muito bonita e elegante, com uma decoração a um tempo exuberante e discreta.




Lembrei-me deste sino por ter achado infeliz a intervenção recente do deputado Paulo Rangel no Parlamento Europeu sobre eventuais problemas na vida política portuguesa relativos à tentativa de controle de meios de comunicação social. Se esses problemas existem não têm dimensão que justifique uma ajuda da União Europeia para os resolver. O pedido de ajuda externa para resolver conflitos que deveriam ser resolvidos internamente é o caminho para a perda da independência.

A Tailândia foi o único país da sua região que nunca foi colonizado.

2010-02-07

Há vida para além da crise

Pelo menos no Cannaregio vão continuar a acontecer muitos pores-de-sol maravilhosos como este, que fixei em Agosto de 2004.


2010-02-04

Faces visíveis

Este tema da eventual proibição da burqua e do nikab em França tem criado uma polémica que me tem interessado.

Passo a destacar os argumentos que têm aparecido contra a proibição que:
1) não passa de uma intolerância a uma religião (muçulmana) correspondente a uma minoria
2) é uma reacção xenófoba a um costume dos imigrantes
3) afectará pessoas de nacionalidade francesa, ao contrário do que pensam as pessoas que dizem para “irem para a terra deles”
4) inibe a possibilidade que garante a algumas mulheres da Europa poderem sair à rua pois, caso não possam usar a burqua no espaço público, teriam que ficar fechadas em casa
5) impediria o acesso de algumas mulheres da Europa a hospitais e a outros serviços públicos
6) é uma atentado à liberdade de cada um andar vestido como lhe apetece
7) é desajustada porque há muito pouca gente a usar burqua
8) é a resposta pretendida pela provocação do seu uso, sendo portanto desadequada

Passo a rebatê-los um por um:

Em relação ao argumento (1) de se tratar de uma costume religioso tenho dois argumentos, em primeiro lugar duvido que se trate de uma prática religiosa essencial ao Islão, como já afirmei em post anterior, havendo apenas uma coincidência geográfica entre zonas onde existe este costume da burqua e zonas de implantação do Islão. Diga-se de passagem que o Islão não se distanciou nem proibiu o seu uso mas existem países com milhões de mulheres muçulmanas onde não se vêm burquas pelo que o seu uso não pode ser essencial à religião muçulmana. Mais importante do que este argumento é a submissão necessária das práticas religiosas ao enquadramento jurídico dos países da União Europeia. Para usar um exemplo simples, os sacrifícios humanos praticados pela religião Maia não seriam tolerados na Europa pelo facto de serem de índole religiosa pois violam leis existentes, neste caso de não ser morto.

O argumento (2) tem a fraqueza habitual e batoteira de classificar de medo irracional (fobia) uma oposição a um costume exterior (xénon). Os costumes existentes numa sociedade resultam de uma história longa de tentativa e erro e embora possam representar soluções erradas ou desadequadas a novas condições merecem, em princípio, maior consideração do que os que são trazidos por imigrantes. A sociedade de acolhimento forneceu melhor condições de vida do que a sociedade que originou a emigração pelo que os seus costumes merecem à partida maior crédito. Assim como uma tradição da sociedade de acolhimento não é forçosamente boa, tão pouco o será a tradição de uma comunidade imigrante.

O argumento (3) pode até ser interpretado de forma algo maldosa, ao discriminar entre franceses e emigrantes, mas limitar-me-ei a dizer que a proibição deve ser aplicada no território da França, para preservar as regras de convívio ainda dominantes nesse território, não é relevante se vai afectar franceses ou emigrantes.

O argumento (4) é assustador ao admitir a existência de “prisões privadas” em território francês, i.e. as casas particulares de pessoas que não poderiam sair à rua sem burqua. O Estado tem o monopólio das prisões.

O argumento (5) é parecido ao argumento (4). Nada mais fácil para quem use uma burqua e queira aceder a serviços públicos: basta tirar a burqua.

Quanto ao argumento (6), de cada um dever ser livre de andar como lhe apetece, tenho dois contra-argumentos: o primeiro é que é esmagadora a probabilidade da mulher não ter tomado a decisão de usar a burqua de livre vontade. Não se trata aqui dum dilema de presunção de inocência, sendo melhor deixar um culpado em liberdade do que prender um inocente. Trata-se de avaliar o que será melhor, se proteger a maioria das mulheres que é forçada a usar burqua ou se respeitar o desejo da minoria que a pretende usar. Mesmo admitindo que haja mulheres que, de sua livre vontade, pretendam usar a burqua, considero que essas mulheres precisam de ser contrariadas, a bem da qualidade do relacionamento com os outros elementos da sociedade em que se inserem. Sinto-me com o direito a ver o rosto de cada pessoa que partilha comigo o espaço da cidade. Se essas pessoas não suportam ser olhadas por outros seres humanos poderão pedir auxílio médico ou ir para uma zona deserta onde vejam muito pouca gente.




Para ilustrar o aspecto doentio do relacionamento com ocultação de identidade escolhi a figura acima, mostrando uma reunião de uma sociedade secreta de malfeitores, do álbum do Tintin, “Les Cigares du Pharaon”.

Quanto ao argumento (7), referindo que há pouca gente, uso o imperativo categórico, o que interessa não é quantas pessoas usam burqua mas se queremos viver numa sociedade em que uma quantidade apreciável de pessoas o faça. Reconheço aqui que há considerações práticas importantes, por exemplo não vejo necessidade em fazer uma lei que proíba atar os pés das meninas para os deformar, como se fazia na China, dado que não há notícia dessa prática desde há muitos anos.

Quanto ao argumento (8), reconheço-lhe alguma validade, no entanto preferiria viver numa sociedade em que as pessoas pensassem que nem valeria a pena ir para a rua com burqua porque essa indumentária seria imediatamente apreendida e substituída por outra discreta mas que assegurasse a visão do rosto. Na realidade surpreende-me que não exista em França uma lei que proíba a ocultação do rosto em espaços públicos, por uma simples questão de segurança, como ilustram aqui o Tintin e o capitão Haddock, disfarçados de alegres Turlurons, prestes a executar um golpe de estado no álbum “Tintin et les Picaros”.

Para finalizar deixo as fotografias iluminadas (da altura praticamente de uma pessoa) que orientam as pessoas no Centro Comercial dos Olivais quando se dirigem ao WC. Interrogo-me se continuaríamos a conseguir distinguir os géneros caso o comprimento do cabelo fosse o mesmo em cada figura.




Mas ao ver estas caras consolo-me de ter nascido numa civilização em que as faces são normalmente visíveis e não ocultas.