2010-07-31

Ainda a ponte de Khaju

Era sexta-feira, dia de descanso no Irão, havendo muito mais gente na ponte do que nos dias de trabalho. Havia algum caudal, como é patente na foto, mas o leito era pouco profundo. Nota-se que havia grupos de homens e de mulheres mas também vários casais.



Certamente que havia um sistema de açudes como em Coimbra para criar este "lago" com alguma largura a jusante da ponte. As margens estão muito bem ajardinadas e todo o ambiente, água e jardins, está num estado de limpeza notável.

2010-07-30

As pontes de Isfahan

O Irão situa-se na maior parte num planalto a uma altitude de 1200m. Com uma superfície enorme de 1.600.000 km2 (mais de 17 vezes maior que Portugal) tem 70 milhões de habitantes (apenas 7 vezes mais do que os Portugueses).

Cai pouca chuva na maior parte do território, com as excepções de uma faixa no Norte e outra no Oeste. As montanhas altas existentes, que chegam a ultrapassar os 5000m de altitude, criam condições favoráveis a alguma chuva e neve que se infiltra no solo criando lençóis freáticos nos sopés da montanhas, onde se estabelecem as aldeias, as vilas e as cidades, presumo que dependendo da abundância da água.

Os rios são raros, assumindo a forma do nosso “Basófias”, o Mondego, assim chamado pelo seu enorme leito de cheia por onde muitas vezes corre apenas um fiozinho de água.

Na cidade de Isfahan passa o rio Zayandeh, cujo nome significa “fonte da vida”, o maior rio do planalto central do Irão, nascendo nos montes Zagros e desaguando no deserto Kavir.

O caudal anual médio deste rio é 38 m3/s (metros cúbicos por segundo). Em comparação, o rio Mondego tem um caudal anual médio de 108 m3/s enquanto o Douro tem 714 m3/s.

A água é portanto aqui um líquido muito mais precioso do que em muitas outras partes do mundo e as pontes de Isfahan não são apenas um local de passagem de uma margem para a outra mas também um local de lazer, de frescura e de contemplação da fonte da vida.

Esta foi a minha primeira vista da ponte Khaju, construída por volta de 1650, no seu lado ensolarado



e esta é uma vista da mesma ponte do seu lado à sombra, não deixando dúvidas sobre as preferências dos iranianos entre o sol e a sombra



enquanto por baixo dos arcos da ponte existem plataformas onde colocam os tapetes persas para fazer piqueniques,



num local de ainda maior frescura onde se ouve o ruído tranquilizador da água que corre em abundância.

2010-07-29

Arrefecendo o ar

Quando no post anterior disse que os iranianos do centro de Yazd, com as suas torres para captar o vento, pareciam melhor preparados para enfrentar o calor do que os portugueses mais as suas marquises, o que eu queria verdadeiramente dizer era que via cuidado arquitectónico da parte dos iranianos e desleixo da nossa parte. Mas embora tenhamos tratado mal os aspectos passivos da arquitectura, há sinais de melhoria notórios, por exemplo no Parque da Nações, e estamos muito melhor do que o Irão nos aparelhos de ar condicionado, como aliás em muitas outras coisas.

Na actualidade as torres devem ser caras e pouco eficientes, face aos modernos aparelhos de ar condicionado.

É o que nos mostra a imagem aqui ao lado, um enquadramento ligeiramente diferente da imagem do post anterior onde além das torres que captam o vento se constata a presença de um “Arrefecedor evaporativo” marcado a verde, em conjunto com a conduta de ar que lhe está associada, também rodeada por um rectângulo verde e a parte exterior de um aparelho de Ar condicionado “split”, isto é com o permutador de calor exterior (envolto em círculo vermelho) ligado ao permutador de calor interior através de um tubo isolado de cor preta, também assinalado com uma elipse vermelha.

Estas duas fotos a seguir





mostram dois aparelhos novinhos em folha, na esquerda chamam-lhe “Desert Cooler”, na direita constata-se que a eficiência energética do aparelho é fraca pois está no fundo da tabela, correspondendo à letra G. Estes aparelhos muito simples constam de um ventilador que faz passar o ar por um sítio onde se evapora água, sendo mais eficientes em climas secos, onde é fácil obter a evaporação. Têm a vantagem de ser simples e de gastarem pouca energia, têm o defeito de gastarem água, de enferrujarem com facilidade e de se inserirem mal na arquitectura pois precisam de estar ligados a um tubo de ventilação enorme. Vi estes aparelhos também no Rajastan, no norte da Índia, uma zona também de clima muito seco. Muitas vezes os aparelhos obstruíam completamente o que tinha sido uma janela.

Achei curioso que no meio de coisas tão diferentes houvesse esta uniformidade de classificação de eficiência energética. É um conceito novo que nasceu na era da globalização, sendo o grafismo global desde o início, quer em electrodomésticos vendidos em Portugal quer no Irão! Na Wikipédia tem esta entrada sobre estes aparelhos.

Na imagem seguinte mostro as coberturas de alguns prédios de Teerão, onde se constata a prevalência destes aparelhos, vendo-se apenas uma torre de arrefecimento dum aparelho de ar condicionado moderno no topo dum edifício próximo do canto superior direito da imagem. Vêm-se também algumas condutas à “espera” de arrefecedor, os aparelhos devem estar a arranjar.




Mas muito pior do que as nossas marquises é este prédio em Teerão em que juntam a heterogeneidade dos alumínios à corrupção ainda mais drástica da fachada.


2010-07-28

Captadores de vento

Uma das coisas que eu tinha curiosidade de ver ao vivo no Irão eram as torres para captar o vento (badgirs), referidas em muitos artigos sobre arquitectura bem adaptada ao clima, como estas que vi em Yazd, uma cidade no deserto, como a maioria das cidades no Irão, país que me pareceu ser um arquipélago de oásis.



No Ocidente, no terceiro quartel do século XX, a abundância de energia eléctrica muito barata, levou os arquitectos a ignorar os elementos do projecto dos edifícios que asseguravam conforto térmico sem grande gasto de energia, adoptando as fachadas de vidro que, concretizando o sonho de deixar passar o máximo de luz possível, como se tentou tanto nas paredes das catedrais do norte da Europa, eram muito gastadoras de energia neste Portugal cheio de sol.

Estas torres cujo funcionamento está descrito aqui em inglês e ali em espanhol, fazem passar o ar por uma superfície com água, para refrescar o interior das casas durante os Verões em que ocorrem sempre temperaturas muito elevadas. Em Yazd, por exemplo, estão agora temperaturas parecidas às de Lisboa, com máximas nos 34-35ºC e mínimas nos 20ºC.

Mas enquanto nós destruímos o efeito refrescante das varandas, que no Verão criavam sombra nas janelas e paredes, para colocar as marquises que fazem efeito de estufa, tornando as casas muito mais quentes, os iranianos do centro de Yazd parecem melhor preparados para afrontar estes calores, mantendo ainda algumas torres para captar o vento no centro histórico da cidade.



Finalizo com a vista por baixo de uma destas torres, num hotel de charme construído a partir de uma adaptação de uma casa antiga.

2010-07-26

Fonte

Para refrescar um pouco deste calor que as pessoas às vezes esquecem que costuma aparecer no Verão.

2010-07-23

Imagens de texto com texto

Neste blogue as imagens são contextualizadas com os textos que as acompanham. Neste post além de terem um contexto são mesmo feitas de texto.

Num destes dias apareceu-me um e-mail daquelas cadeias em que as pessoas reenviam anedotas, fotografias, filmes, etc. Nesse e-mail dizia que o art. 1º do Dec.-Lei 35/2010 de 15 de Abril começa com este texto notável (a menos de duas vírgulas que tomei a liberdade de inserir):
«
Os artigos 143.º e 144.º do Código do Processo Civil aprovado pelo Decreto -Lei n.º 44 129, de 28 de Dezembro de 1961, alterado pelo Decreto -Lei n.º 47 690, de 11 de Maio de 1967, pela Lei n.º 2140, de 14 de Março de 1969, pelo Decreto -Lei n.º 323/70, de 11 de Julho, pela Portaria n.º 439/74, de 10 de Julho, pelos Decretos -Leis n.os 261/75, de 27 de Maio, 165/76, de 1 de Março, 201/76, de 19 de Março, 366/76, de 15 de Maio, 605/76, de 24 de Julho, 738/76, de 16 de Outubro, 368/77, de 3 de Setembro, e 533/77, de 30 de Dezembro, pela Lei n.º 21/78, de 3 de Maio, pelos Decretos -Leis n.os 513 -X/79, de 27 de Dezembro, 207/80, de 1 de Julho, 457/80, de 10 de Outubro, 224/82, de 8 de Junho, e 400/82, de 23 de Setembro, pela Lei n.º 3/83, de 26 de Fevereiro, pelos Decretos -Leis n.os 128/83, de 12 de Março, 242/85, de 9 de Julho, 381 -A/85, de 28 de Setembro, e 177/86, de 2 de Julho, pela Lei n.º 31/86, de 29 de Agosto, pelos Decretos -Leis n.os 92/88, de 17 de Março, 321 -B/90, de 15 de Outubro, 211/91, de 14 de Junho, 132/93, de 23 de Abril, 227/94, de 8 de Setembro, 39/95, de 15 de Fevereiro, 329 -A/95, de 12 de Dezembro, pela Lei n.º 6/96, de 29 de Fevereiro, pelos Decretos -Leis n.os 180/96, de 25 de Setembro, 125/98, de 12 de Maio, 269/98, de 1 de Setembro, e 315/98, de 20 de Outubro, pela Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro, pelos Decretos -Leis n.os 375 -A/99, de 20 de Setembro, e 183/2000, de 10 de Agosto, pela Lei n.º 30 -D/2000, de 20 de Dezembro, pelos Decretos -Leis n.os 272/2001, de 13 de Outubro, e 323/2001, de 17 de Dezembro, pela Lei n.º 13/2002, de 19 de Fevereiro, e pelos Decretos-Leis n.os 38/2003, de 8 de Março, 199/2003, de 10 de Setembro, 324/2003, de 27 de Dezembro, e 53/2004, de 18 de Março, pela Leis n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro, pelo Decreto -Lei n.º 76 -A/2006, de 29 de Março, pelas Leis n.º 14/2006, de 26 de Abril, e 53 -A/2006, de 29 de Dezembro, pelos Decretos -Leis n.os 8/2007, de 17 de Janeiro, 303/2007, de 24 de Agosto, 34/2008, de 26 de Fevereiro, 116/2008, de 4 de Julho, pelas Leis n.os 52/2008, de 28 de Agosto, e 61/2008, de 31 de Outubro, pelo Decreto -Lei n.º 226/2008, de 20 de Novembro, e pela Lei n.º 29/2009, de 29 de Junho, passam a ter a seguinte redacção:
»
O e-mail concluía dizendo que isto esclarecia porque que é que tantos funcionários públicos correm para a aposentação.

Com a minha tendência para Pangloss, acreditando que vivemos no melhor dos mundos possíveis, indaguei junto de especialistas da razão de aparecer um texto legislativo de tão difícil apreensão, quando o comum dos mortais gostaria que as leis fossem claras.

Explicaram-me que a razão para frase tão comprida se deve a que ela descreve de forma rigorosa e completa a evolução ao longo de quase 40 anos do Código do Processo Civil, possibilitando aos interessados o acesso não só à versão corrente, que é explicitada a seguir a este texto, como também reconstruir, se bem que com algum trabalho, as várias versões pelas quais passou o Código do Processo Civil.

Lembrei-me de importar o texto para uma folha MS Excel considerando as vírgulas como separadores, ficando com uma primeira linha onde estão todos os itens que estavam separados por vírgulas, cada um na sua célula.

Fazendo um copy-seguido de paste special em A2 com a opção transpose ficam visíveis na primeira coluna todos esses itens. Mais algumas manipulações que dão pouco trabalho (que poderei descrever se solicitado) e as datas vão para a frente dos documentos, conforme mostra a imagem de texto:

Não resisto a manifestar o meu embasbacamento perante este conceito de folha de cálculo, tão bem implementado no Microsoft Excel, que tanto serve para fazer contas como para desenhar mosaicos persas ou como aqui para tornar mais inteligíveis textos corridos, transformando-os em tabelas.

Esta tabela de duas colunas tem uma legibilidade muito maior do que o texto referido.

Às vezes penso que a legislação, aliás como os acórdãos dos tribunais, vem de uma tradição de oralidade em que o texto não reproduz mais do que a fala de uma pessoa.

Os engenheiros gostam mais de apresentar a informação em tabelas, gráficos e mesmo power-points.

Parece-me útil que a legislação contenha texto que documente a sua evolução ao longo do tempo, mas parece-me que seria preferível que o próprio D.R. apresentasse este tipo de textos numa nota de rodapé, como uma tabela em anexo, ou mesmo na forma de “tabela de versões”, em vez de o apresentar no corpo principal.



Googlando “Os artigos 143.º e 144.º do Código do Processo Civil” fui levado aqui:



e depois aqui:

onde constatei a existência de ferramentas facilmente acessíveis que são essenciais. Não só as alterações são facilmente legíveis como o site disponibiliza as sucessivas versões do Código em questão.

Este post fez-me ainda passar pelo Simplegis, um Programa de Simplificação Legislativa, que endereça temas mais sérios e muito mais complicados do que este fait-divers.

2010-07-17

A nitidez de Madrid

Talvez por ser míope e só conseguir ver as coisas ao longe nítidas usando óculos, aprecio muito a nitidez. Os dias de ar transparentes e céu azul deixam-me particularmente bem disposto. Foi por isso com alegria que tirei esta foto em Madrid, numa transversal à Alcalá, num dia de sol radioso embora excessivamente quente.




Depois tirei uma foto mais genérica à rua. Já em casa interroguei-me o que seria esta COAM, chegando pelo Google à conclusão que se trata do Colegio Oficial de Arquitectos de Madrid, na Calle del Barquillo, o que me pareceu bastante apropriado, dada a beleza dos prédios circundantes.




As esquadrias de cor diferente à volta das janelas são usadas em muitos prédios, quer de Portugal quer de Espanha. Eu quase que não poderia deixar de gostar destes contrastes fortes, pois acentuam a nitidez da imagem. Gostei mesmo de ver este prédio:

2010-07-13

Gerar formas de mosaicos com o Microsoft Excel



Nesta foto tirada numa mesquita na cidade de Yazd no Irão fiz um enquadramento e uma ligeira distorção para que o painel de cerâmica fosse apresentado com a forma rectangular neste post.






Recentemente fiz um enquadramento mais reduzido, que mostro também aqui ao lado, e comecei a pensar se seria viável reproduzir os desenhos geométricos do painel usando a folha de cálculo Excel da Microsoft.

A ideia seria gerar apenas os contornos das figuras pois uma vez que eles estejam definidos é fácil colorir o interior usando, numa aplicação de modificação de imagens digitais, uma ferramenta equivalente à “fill with color” disponível no programa básico “Paint” da Microsoft.

Fiz um ficheiro Excel que está à disposição de eventuais interessados no meu site, com o nome Yazd_4.xls.




Numa primeira aproximação ao problema considerei que poderia desenhar um a um os quadriláteros brancos (os seus contornos), conforme destaco aqui ao lado, com os contornos a vermelho do primeiro quadrilátero.

Para o tratamento ser mais simples é conveniente usar coordenadas polares na definição dos pontos, que se situam sempre em ângulos múltiplos de 22,5 graus (45 graus/2).

Numa primeira tentativa defini as coordenadas dos pontos como um pouco menos e um pouco mais do que o R inicial do ponto colocado sobre o eixo dos XX.

Posteriormente calculei esses valores para respeitar a forma de polígono de 8 bicos que refiro à frente.








Repetindo os pontos do quadrilátero 8 vezes, o que é muito fácil, pois basta somar 45 graus a cada um dos pontos anteriores, mantendo a distância ao centro idêntica à do ponto equivalente do quadrilátero anterior, consegue-se associar a uma única série de pontos ("Data Series" do Excel) o conjunto de 8 quadriláteros, desde que haja o cuidado de deixar uma linha em branco entre cada série de 5 pontos que definem o contorno de cada quadrilátero (o 5º ponto coincide com o 1º, para fechar a linha).






Ao olhar para o mosaico detecta-se que esta estrela de 8 pontas que mostro aqui ao lado é um padrão recorrente.

Disseram-me na altura, já não me lembro bem se na cultura especificamente iraniana se mesmo no Islão, que havia bastante simpatia pelos 4 lados do quadrado e pelos oito lados do octógono, que se associavam a conjuntos de conceitos agradáveis.

Noutras culturas gostam mais do número 3, ou do 5 mas eu também gosto desta figura que se obtém com grande facilidade a partir de 2 quadrados iguais rodando um deles 45 graus. A figura apresenta imensas simetrias, parecendo bastante apropriada para estes padrões de mosaicos.




Na realidade, conforme se pode constatar na figura ao lado, o anel de 8 quadriláteros que mostrei atrás é limitado por dois polígonos de 8 bicos, representando aqui o interior com cor vermelha e o exterior com cor verde.

É fácil constatar que cada anel de 8 quadriláteros que se adiciona ao polígono de 8 bicos exterior vai gerar um novo polígono de 8 bicos rodado de 22,5 graus.

No interior do polígono de 8 bicos estão 4 triângulos que desenhei numa "Data Series" específica.










Mostro agora a fotografia como background de um gráfico do Excel sobre o qual se desenharam as linhas cor de laranja correspondentes aos gráficos que temos vindo a falar.


A realização dos mosaicos tem imperfeições mais difíceis de evitar do que no Excel onde, á parte alguma pixelização é tudo quase perfeito, como o mundo das ideias do Platão.










Finalmente mostro o padrão final, correspondente apenas a uma pequena parte do centro do mosaico



e uma variante em que adicionei mais um anel de quadriláteros, desta vez verdes.


2010-07-09

Árvores em flor

Deixei passar os Jacarandás, ainda tentei fotografar as Tipuanas Tipus mas sem suecsso pelo que deste tema, neste Verão, ficaram-me estas imagens de árvores ou arbustos, primeiro uma árvore de que não sei o nome nos Olivais Sul:




depois uma Buganvilia exuberante no Jardim Garcia da Orta no Parque das Nações:




e finalmente um aloendro branco na Praia da Rocha:


2010-07-06

A Procura da Felicidade

Tomei nota da existência deste livro "The Pursuit of Happiness- A History from the Greeks to the Present" por uma referência do cronista João Pereira Coutinho num programa de TV há uns três anos. O autor é Darrin McMahon, professor de História na Universidade da Flórida. Existe uma edição em português das Edições70 com o título “Uma História da Felicidade”.

O livro descreve as abordagens sucessivas do tema da felicidade na civilização ocidental, dos gregos até aos nossos dias. A versão inglesa em paperback da Penguin tem 480 páginas seguidas de 43 páginas de notas referidas ao longo do livro. Para espíritos não académicos como o meu, talvez metade das páginas fosse suficiente, mas a narrativa da evolução do pensamento sobre este tema mantém o interesse do princípio ao fim.

Uma das capas do livro (na net apareceram-me várias capas) apresenta uma parte do quadro “Fortuna” do pintor Jean François Armand Felix Bernard (1829-1894). Quando se vê a totalidade do quadro é mais evidente que a Fortuna trata mesmo é de dinheiro, não estando aqui a representar fortunas de ordem espiritual.

Começando nos gregos, designadamente em Aristóteles, passando por Epicuro, pelos Estóicos, por St.Agostinho, Pelágio, S.Tomás de Aquino, Locke, Hobbes, Rousseau, Adam Smith, A.Tocqueville, J.Stuart Mill, Max Weber, Socialistas utópicos e “científicos”, Darwin, Freud e mais uns tantos que ou me esqueci ou não me apeteceu citar, o tratamento do tema é bastante exaustivo.

É um excelente ponto de situação daquilo que já sabemos, que eu poderia resumir em a felicidade estar associada a transições de estados e não a um estado.

Não pretendendo resumir neste pequeno post uma história tão vasta gostaria mesmo assim de descrever que depois dos conceitos gregos da necessidade da moderação, quer nos desejos quer nos prazeres que nos permitimos, veio a visão cristã do Vale de Lágrimas e da impossibilidade de atingir qualquer felicidade significativa neste mundo, estando tudo reservado para a vida além da morte. São Tomás de Aquino viu a possibilidade de aceder a alguma beatitude na vida terrena. Não consigo resistir a pensar que a derrocada do império romano e a fragilidade da vida de cada um, sempre sob a ameaça de doenças incuráveis e de ataques assassinos, deram uma forte contribuição para esta visão tão pessimista da vida terrena.

Achei interessante a conjectura do autor de que o sorriso da Gioconda não é tanto um mistério como uma inovação. Antes desse quadro do Leonardo da Vinci os personagens representados não se atreviam a sorrir.

Gostei também da referência a Stuart Mill, quando ele diz que quem procura directamente a felicidade não a encontrará. Só se consegue aceder a ela de forma indirecta, através da realização de outros objectivos. O Evangelho diz algo de muito parecido, como quem quiser ganhar a sua vida perdê-la-á e só a ganhará verdadeiramente quem estiver disposto a perdê-la, dando-a aos outros. Há algo de parecido também no budismo Zen, em que os praticantes andam à procura da iluminação (enlightenment), sendo-lhes ensinado que só a encontrarão (se a encontrarem...) quando deixarem de a procurar.

O livro refere ainda o enorme perigo que representam os profetas que anunciam a felicidade como um estado permanente que se conseguirá atingir nesta terra. Além de várias seitas temos sobretudo o socialismo dito científico que prega a felicidade sobre a terra quando se conseguir acabar com as classes sociais e quando os meios de produção forem propriedade colectiva. Sabemos agora que a teoria não conseguiu uma confirmação prática, tendo deixado infelizmente evidência de grandes tragédias.

Gostei muito das referências a Darwin, que pensou no papel que a sensação de felicidade poderia ter na evolução, embora tenha abordado o tema na sua obra com pouco relevo. Gosto da ideia de sermos estimulados a sermos melhores mas a ficar insatisfeitos com o que conseguimos atingir ao fim de relativamente pouco tempo. Parece um excelente motor de evolução, pese embora a insatisfação associada que faz verdadeiramente parte da condição humana.

Achei curiosas ou reveladoras as escolhas de capas que os editores fizeram para este livro. Enquanto a figura da Fortuna que mostrei acima põe uma tónica forte no acesso ao dinheiro, noção que não é nada evidente no livro, a tradução portuguesa escolhe o quadro do Seurat, “Uma tarde de domingo na ilha da grande Jatte”, um quadro que transmite uma sensação de grande tranquilidade, de pessoas citadinas a desfrutar um dia de sol num parque ajardinado ao pé do rio Sena, que aqui tem o aspecto de um lago.


Suponho que nos anos 60 do século passado este quadro seria considerado uma alienação burguesa, face às dificuldades da classe operária ou dos oprimidos do terceiro mundo.

Parece-me uma representação mais equilibrada da felicidade do que uma praia numa ilha deserta. Na realidade as ilhas desertas não são paradisíacas, caso contrário não estariam desertas.

2010-07-01

Biscoitos persas

Falando em paciência, gostei destes tabuleiros de biscoitos persas altamente organizados.

Foram arranjados por pessoas que (ao contrário destas, referidas aqui) provavelmente fizeram puzzles quando eram pequeninas.