2013-01-31

Construindo e destruindo Catedrais


Não há fome que não dê em fartura, depois de passar muito tempo neste blogue sem falar em catedrais, no ano passado falei bastante do tema, como se pode constatar colocando a palavra catedral na caixa de busca localizada no canto superior esquerdo deste blogue ou simplesmente seguindo esta ligação.

Muitas das catedrais construídas na Europa demoraram dezenas e por vezes centenas de anos na sua construção. Neste último caso por serem intensamente usadas, sendo consideradas como passíveis de melhoramento pelos fiéis de então, enquanto as dezenas de anos seriam devidos ao inevitável recurso à força humana e à dos animais, numa época de escassez de energia.

Sou fã do autor americano David Macaulay, de que as Publicações Dom Quixote editaram “A Catedral”, o seu primeiro livro publicado em 1973, que descreve exemplarmente através de desenhos feitos à mão livre, as técnicas usadas na construção de uma catedral gótica, livro cuja capa mostro a seguir:



A este livro seguiram-se A cidade, descrevendo o urbanismo duma cidade do império romano, A Pirâmide, descrevendo a construção de uma delas no tempo dos faraós, sem necessidade de recorrer a extraterrestres, O Castelo, da Idade Média, e A Cidade Subterrânea, com umas perspectivas espectaculares em que a terra aparece transparente. A obra é muito mais vasta do que isto mas estes eram os da colecção referida.







No livro mostrava a construção de uma coluna, composta por todas aquelas colunelas que referi aqui, acho que inconscientemente estava à espera que as várias colunelas fossem peças independentes encostadas a uma pedra central ou que fosse composta por pedras maciças sobrepostas.




Na realidade era uma composição de várias pedras e o interior era oco preenchido por terra, como se constata na imagem aqui ao lado, que me surpreendeu.









Outro desenho do livro mostrava também uma roda para elevar grandes pesos Esta roda funcionava com um homem a caminhar dentro dela, para o homem era como se estivesse a subir uma ladeira em permanência, seria uma boa aplicação da força do homem que estaria a usar os músculos das pernas, mais fortes do que os braços. Há umas rodas de plástico para ratinhos em que eles podem correr sem sair da gaiola, que são parecidas, funcionando do mesmo modo embora com objectivos  diferentes...



 Talvez por não gostar de fazer força ficou-me esta imagem de uma roda de madeira permitindo içar grandes pesos apenas com a força humana e identifiquei imediatamente a finalidade destas rodas quando as vi





confirmando depois neste desenho acompanhado de um texto




que se tratavam de rodas de uma grua, e não de uma catedral, neste caso do porto de Gdansk, cidade actualmente polaca que se chamou Dantzig quando era alemã, instaladas no edifício ao fundo, quase preto e saliente em relação ao passeio, aproximando-se dos navios que antes aqui atracavam.


Todo este esforço construtivo é por vezes deitado fora. As cidades alemãs foram muito bombardeadas durante a segunda grande guerra e Dantzig não foi excepção. Deixo duas imagens de 1945, no fim da guerra







em que se constata também a destruição das catedrais.

É bom lembrar de vez em quando que o principal objectivo da União Europeia é a criação de relações entre os povos europeus que mantenham a Paz na Europa.

2013-01-24

Leda



Ainda na representação do mundo em duas dimensões, para continuarmos pelo tempo do império romano devemos passar para os mosaicos, dada a raridade das pinturas desses tempos.

Na mitologia grega Zeus, pai dos deuses e dos homens, por vezes assumia a forma de um animal quando pretendia seduzir as mulheres que o atraíam. Foi o que aconteceu com Leda, em que assumiu a forma de um cisne.



É esse o tema deste mosaico que vi primeiro no DVD sobre Chipre que referi aqui mas de que encontrei uma reprodução muito melhor na Wikipédia aqui. Os autores da foto dizem que este mosaico é uma cópia do original datado do século III DC que foi transportado para o museu de Nicósia. Esta cópia foi colocada em Kouklia, local onde estava o original.

Se se procurar imagens de Leda no Google_Imagens constata-se que foi tema que inspirou muitos quadros, o próximo que seleccionei foi dum discípulo de Leonardo da Vinci (ou dele próprio), pintado em 1505 ou 1510



com o pormenor engraçado dos bébés a nascerem em ovos, numa conjectura biológica assaz apressada. Só passado algum tempo me apercebi que uma das asas do cisne está a abraçar a Leda, possivelmente tinha sido distraído pelo insólito dos bébés nos ovos ou pelo insólito duma mulher nua a agarrar um cisne.

Se na primeira imagem o cisne olhava para a Leda bastante exposta e na segunda se via o fruto das aventuras do Zeus com a Leda, na próxima, de Heinrich Lossow (1840-1897), pintor alemão com incursões pela arte erótica, que já não me lembro onde descobri, há uma representação explícita, se bem que obviamente fantasiada, do momento em que  Zeus na forma de cisne, possui a Leda



Numa imagem mais recente, do pintor e illustrador peruano Boris Vallejo, o mesmo tema é representado com maior recato, em que a Leda está por assim dizer “encurralada” num desfiladeiro estreito, esperando pelo cisne que se aproxima.



Estas fantasias são engraçadas bem como este filminho do Youtube em que um cisne real (e não o Zeus) ataca uma noiva descuidada.




Fiquei surpreendido com a abundância de filmes do Youtube em que os cisnes atacam pessoas.

No futuro vou evitar agachar-me ao pé de cisnes, não me parece nada prudente.

Entretanto cheguei a uma conjectura que me parece agora óbvia sobre a origem deste mito: alguém na antiga Grécia observou um ataque de um cisne a uma mulher grega imprudente que se foi banhar ao pé de uma destas aves.

2013-01-17

Fayum


Depois de falar do Egipto fiz um "pequeno" intervalo de 4 posts para falar sobre a exposição "As idades do Mar", dada a "urgência" porque termina em 27/Jan.

Nas deambulações pela net durante a escrita do post "Regresso ao Egipto" passei, já não me lembro porquê, pela referência a Fayum. Fayum é uma localidade do Egipto situada uns cento e tal quilómetros a sul do Cairo, onde foram descobertas pinturas do tempo do império romano que estão datadas dos séculos I AC até III ou IV DC.

São pinturas sobre tábuas de madeira colocadas sobre as múmias dos romanos da classe mais abastada que, vivendo no Egipto, tinham adoptado este hábito local da mumificação. Fayum foi o sítio onde este tipo de tábuas foi primeiro descoberto, tendo-se depois estendido o termo "pintura de Fayum" para este tipo de pinturas funerárias sobre tábuas, mesmo quando descobertas noutros locais.

A maior parte, senão a totalidade desta informação foi tirada, como vai sendo hábito deste blogue, dum post da Wikipédia.

As imagens são também do mesmo artigo da Wikipédia, existindo aí referências a mais imagens.

De uma forma geral são raras as pinturas antigas que chegaram até nós, o que não será de admirar pois são obras mais frágeis do que as esculturas. Mesmo estas chegaram a nós incompletas, designadamente as gregas, que na sua maioria perderam precisamente as tintas de várias cores que as coloriam quando foram feitas.

Estas tábuas são assim preciosas pela sua enorme antiguidade mas também pelas técnicas naturalistas de grande perfeição que mostram existir nessa época de há cerca de 2000 anos! A arte evolui de forma imprevisível e no caso desta pintura o seu estilo foi preterido face a representações mais formais e estilizadas do corpo humano que se tornaram dominantes na arte bizantina.

Os olhos da maior parte destas figuras são bastante grandes e como os retratos são frontais, várias vezes olham para nós, como no caso deste jovem aqui à direita.

Mostro a seguir o retrato  de uma jovem bem penteada e com lindas jóias, que poderia ser do século passado



finalizando com a imagem de uma muher que me parece dos dias de hoje






2013-01-14

Joaquín Sorolla


Ainda da exposição temporária "As Idades do Mar" (provável que esta seja a última referência à exposição neste blogue) na Fundação Calouste Gulbenkian, que decorrerá até ao dia 27/Jan/2013, .seleccionei esta "Figura de Branco",



pintada em Biarritz em 1906 por Joaquín SOROLLA BASTIDA (1863-1923), Óleo sobre tela 63 x 91,5 cm Museo Sorolla, Madrid n.º inv. 773, que fui buscar ao sítio da Fundação C.Gulbenkian dedicado a esta exposição e acima referido. Esta imagem foi escolhida para capa do catálogo da exposição.

Numa deslocação recente a Madrid tive a oportunidade de visitar o Museu Sorolla, no centro da cidade, instalado na casa onde viveu este pintor espanhol, que vira referido num dos power-points que vou recebendo no e-mail. Nesses power-points gostei da luminosidade dos quadros, tenho maior atracção por quadros com muita luz e gostei do que vi. Sendo um museu apenas com obras de um artista é naturalmente pequeno, o que permite dedicar mais tempo à visão de cada obra sem tornar o tempo da visita excessivo.

Nessa visita fotografei este "Paseo a Orillo del mar" de que gostei muito




pintado em 1909. As personagens são a mulher e a filha mais velha do pintor. Depois de alguns retoques na fotografia que fiz no local, deformando a imagem para que a forma de trapézio irregular da fotografia do quadro regressasse à forma rectangular, deformação em que se perde um pouco da nitidez, consultei o site do museu e corrigi a cor para ficar parecida à imagem com menos pixels apresentada aqui.

O controlo da cor é uma tarefa muito complicada, dificultada ainda mais pela falta de consistência dos écrans dos PCs onde estas imagens são vistas, o que poderá até simplificar a tarefa tornando-a inglória, pois sabe-se que muitas pessoas verão uma restituição de cores bastante afastada do original. Parti do princípio que as pessoas do museu terão tentado uma reprodução boa das cores do quadro e tentei que a minha foto ficasse com umas cores que se aproximassem da imagem do sítio do museu.

Figuras femininas de branco a passear na praia com longos vestidos brancos e um mar azul também foram fixadas por Kroyer em 1893, num quadro que já mostrei noutro post deste blogue. Por coincidência, ou "necessidade compositiva", também nesse quadro uma das protagonistas tinha o chapéu na cabeça e a outra na mão.

Nesses tempos as senhoras protegiam-se muito bem dos perigosos raios do Sol, com vestidos bastante abrangentes, chapéu e ainda uma sombrinha!

No museu Sorolla em Madrid gostei também muito destas "Pescadoras Valencianas", pintadas em 1915,



que fotografei no museu, retoquei como na foto anterior e a que corrigi a cor para ficar parecida à cor da imagem daqui.



2013-01-12

Ainda o Mar

Ainda da exposição temporária "As Idades do Mar" na Fundação Calouste Gulbenkian, que decorrerá até ao dia 27/Jan/2013, seleccionei esta "Sinfonia",



de Giorgio Belloni (1861-1944), pintada em 1896, que fui buscar aqui.

Engraçado como o dinamarquês do post anterior pintou uma cena luminosa enquanto este italiano prefere tonalidades escuras. Quando vi este quadro na exposição não me pareceu triste, agora já não sei, ainda existem uns reflexos duns raios de sol mas as nuvens estão muito escuras.

Talvez seja influência do relatório do governo que, por qualquer motivo que me escapa, escreveram em inglês e dizem ser do FMI. O João Pinto e Castro escreveu vários posts interessantes sobre o relatório de que se fala aqui e em mais 3 posts publicados no dia 10/Jan/2013 no blogue Jugular.

O Luís M.Jorge e o Filipe Nunes Vicente também escreveram posts interessantes sobre o famigerado relatório no blogue "Declínio e Queda" no mesmo dia, aqui e aqui.

2013-01-08

Migrações


Ainda da exposição temporária "As Idades do Mar" na Fundação Calouste Gulbenkian, que decorrerá até ao dia 27/Jan/2013, seleccionei esta "Migração de pássaros",



uma obra de 1924 do pintor dinamarquês Johannes Larsen (1867-1961), Crédito fotográfico: SMK Foto. Statens Museum for Kunst © Johannes Larsen, Copy-Dan, 2012, Óleo sobre tela 182 x 262 cm Folketinget, Copenhaga Inv. A 0069.


Mais uma metáfora do Portugal 2013, mar agitado, emigrantes.

O quadro é bastante grande e deixou-me bem disposto, muita luz, um mar revolto mas que não representa perigo para as aves migratórias, bonita de ver a luz sobre a espuma branca, talvez uma visão um pouco idílica das cores que, para aquelas paragens do Norte, se esperariam mais cinzentas.

2013-01-05

Mau tempo no canal

Fui no outro dia ver a exposição temporária "As Idades do Mar" na Fundação Calouste Gulbenkian, que decorrerá até ao dia 27/Jan/2013.

Gostei muito do que vi e, embora não se possam tirar fotografias, o próprio "site" associado à exposição tem algumas reproduções digitais das obras espostas, o que acaba por ser melhor em muitos casos.

Para este post seleccionei "Uma vista do cabo Stephens no estreito de Cook com trombas de água"




pintado por William Hodges em 1776 e que fui buscar aqui. O cabo Stephens está na ilha Stephens, uma ilha pequena situada no estreito de Cook, o braço de mar que separa as duas ilhas principais da Nova Zelândia.

O ambiente é muito dramático e pareceu-me apropriado como metáfora de Portugal em 2013.

Acho que o que gostei mais foi o cone de água iluminado do lado esquerdo da pintura, em grande contraste com a escuridão circundante. Não percebo qual a necessidade de colocar uma mulher em tronco nu de costas com um bébé ao colo no meio desta tempestade, o homem que está ao pé dela bem podia emprestar-lhe alguma roupa, talvez seja o equivalente das "necessidades narrativas" dos romances.

O ano de 1776 fez-me lembrar 1775, o ano do terramoto de Lisboa.

2013-01-01

Regresso ao Egipto


As línguas de fogo do Espírito Santo sobre as cabeças dos apóstolos no mosaico de uma das cúpulas da Basílica de S.Marcos em Veneza fizeram-me pensar nestas damas com adornos nas cabeças que aparecem nesta imagem:



Trata-se da digitalização de um folheto muito antigo de propaganda médica que tenho em casa e que julgo ter visto também na numerosa colecção de fac-símiles existente no Metropolitan Museum of New York. O folheto tinha um texto que resumidamente dizia ser uma imagem da necrópole de Tebas, túmulo 51de Userhet, súbdito do faraó Seti I (19ª dinastia, cerca de 1300 AC), tratando-se dos “retratos” de duas damas da aristocracia, talvez a mãe e uma esposa de Userhet.

Quando vi a imagem pela primeira vez pensei que os adornos nas cabeças seriam penas de aves, um bocado como os índios da América do Norte. Só muito mais tarde, quando me veio parar às mãos uma compilação encadernada de revistas da National Geographic, aprendi que aquelas coisas em cima das cabeças eram cones de gordura perfumada que os egípcios ricos punham nas cabeças durante as festas.

Nessa compilação de parte do ano de 1941 constava um artigo bastante longo e profusamente ilustrado sobre o Antigo Egipto em que, além das reproduções das pinturas egípcias antigas, tinham também pinturas contemporâneas tentando representar as cenas das pinturas antigas através de técnicas de pintura da cultura ocidental predominantes desde o Renascimento até ao Impressionismo.

Para ilustrar melhor o que quero dizer mostro uma imagem dum cortesão caçando aves no Nilo no primeiro plano, enquanto ao fundo outro se dedica á pesca com arpão





Esta imagem é uma reinterpretação, feita pelo pintor Herbert M. Herget(1885-1950), de outra antiga que estava na revista do National Geographic a preto e branco mas a cores neste sítio, reproduzindo um fac-símile do MET, com mais umas observações interessantes sobre o conteúdo das imagens.



Em ambas as imagens aparecem os mesmos personagens, o caçador sobre um barco de papiro caçando aves, acompanhado pela mulher, ambos vestidos de branco, uma jovem sentada, um rapazinho em tronco nu e uma rapariga apenas com uma tanga reduzida, debruçada sobre a água. Na representação contemporânea o barco com o homem a pescar com arpão tem apenas duas personagens enquanto no original está mais gente.

Há um pormenor desagradável nesta pintura que parece ter sido vítima de iconoclastas, pois a parte mais danificada são os rostos, não havendo à partida nenhuma razão para os rostos se danificarem mais cedo do que as outras partes das pinturas.

Em casa tenho uma reprodução desta outra imagem que fui buscar ao site do MET:




dando a entender que era um tema recorrente em vários túmulos.

Gostei ainda das cores vivas e da variedade de aves representadas nesta outra imagem (além dum gato...) que estava aqui




Na procura de reproduções destas imagens encontrei menções mais frequentes do que as habituais a direitos de copyright. Acho um bocado estranho que cópias fotográficas dos fac-similes do Metropolitan Museum of Art possam ser protegidas por copyright, acho esse direito absurdo, pretender um direito de cópia sobre uma cópia!

Aliás acabo de ver na Wikipédia que nos EUA têm a mesma opinião, conforme se constata neste parágrafo: “In the U.S., reproductions of two-dimensional public domain artwork do not generate a new copyright; see Bridgeman v. Corel. Scans of images alone do not generate new copyrights—they merely inherit the copyright status of the image they are reproducing. For example, a straight-on photograph of the Mona Lisa is ineligible for copyright.”

Mesmo as imagens “naturalistas” do National Geographic Magazine, publicadas em 1941 já deveriam estar no domínio público.

Mas regressando aos adornos nas cabeças, diziam no texto que a gordura se ia liquefazendo ao longo da festa e que o óleo escorrendo pela pele daria uma sensação de frescura. À parte o aspecto de alguns óleos hidratarem a pele, o que deve dar muito jeito em atmosferas secas com a do Egipto, não me parece que no final das festas as pessoas estivessem com muito bom aspecto, se o hábito fosse bom teríamos pelo menos alguns sítios em que esse costume estivesse mantido. Mostro a seguir outra “reconstituição de H.M.Herget, desta vez de uma festa em que existem convivas com cones na cabeça:



Outro aspecto menos comum para os costumes ocidentais será a presença de bailarinas quase totalmente despidas. Pensando melhor, as bailarinas dos carnavais do Brasil também se apresentam com muito pouca roupa, será uma defesa nos países quentes contra o calor de quem tem que fazer muitos movimentos.

Para finalizar mostro uma imagem antiga que poderá ter inspirado H.M.Herget para uma parte da imagem acima: